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Pesquisa aponta vivências de prazer e sofrimento na Pós-Graduação stricto sensu em Enfermagem

“Percebi que produtividade, vaidade e competitividade eram termos recorrentes no cotidiano de docentes e discentes da Pós-Graduação”, narra a enfermeira Danielle de Araújo Moreira, em sua tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, justificando seu interesse em produzir os estudos que tiveram como objetivo compreender a relação prazer-sofrimento no trabalho de professores e alunos na Pós-Graduação stricto sensu em enfermagem. “Os relatos de usos de ansiolíticos e antidepressivos, atrelados à constante dúvida expressa por colegas, em continuar ou não o mestrado ou doutorado, despertaram em mim a necessidade de compreender porque, a despeito das vivências de sofrimento, a maioria dos estudantes persistia e concluía o curso”, completa. 

defesa da daniO estudo, que teve uma abordagem qualitativa com 44 participantes, 21 docentes e 23 discentes, revelou que a relação prazer-sofrimento na Pós-Graduação stricto sensu em enfermagem sofre interferências externas e internas aos programas e que as vivências de docentes e discentes são influenciadas pela organização do trabalho e pelas relações interpessoais. Os dados foram coletados entre maio de 2017 e abril de 2018, por meio de entrevistas e análise documental em dois programas de Pós-Graduação em enfermagem: o Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFMG e o da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 

Danielle aponta que o sofrimento pode começar antes mesmo do início do curso. “Ingressar em um curso de Pós-Graduação stricto sensu não é tarefa fácil. A competitividade já começa na seleção, momento em que se dá a avaliação do currículo. Esta situação, por si só, contribui para gerar ansiedade e angústia”, argumenta. 

A pesquisa separa as relações de sofrimento e prazer entre docentes e discentes. Apesar dealguns pontos serem comuns aos dois, Danielle procurou dar atenção às especificidades de cada vivência. Para os alunos, o sofrimento foi relacionado à cobrança da Pós-Graduação, à produtividade e as disciplinas cursadas, a relação discente/discente, discente/orientador, discente/professor e ao trabalho solitário. 

“Parece que virou regra, tem que sofrer para estar na Pós-Graduação. É assim mesmo, ficar sem dormir, tomar tarja preta, ansiolítico, antidepressivo, é tudo normal”, narra um dos discentes - todos os integrantes do estudo tiveram sua identidade preservada -, participantes da pesquisa. Danielle aponta, também, a cobrança como causa de sofrimento. “A cobrança quantitativa rompe com o propósito pedagógico, repercutindo na formação e nos ideais dos alunos”.

Apesar de esses pontos gerarem sofrimento aos pós-graduandos, alguns deles também são apontados como geradores de prazer, por exemplo as disciplinas cursadas e as relações interpessoais. Além destes, o conhecimento adquirido, o reconhecimento do trabalho, o conceito da universidade e a pesquisa, também são apontados como fontes de prazer.

“Tem alguns momentos que com certeza a gente se sente mais feliz, principalmente quando o trabalho é reconhecido (...) ver esse retorno do que a gente faz é gratificante e nos motiva a melhorar e construir conhecimento cada vez mais”, exemplificou um dos alunos entrevistados. 

Já para os professores, o prazer está relacionado a gestão, as aulas, a pesquisa e a defesa de dissertações/teses e ao relacionamento com o discente. O sofrimento docente possui, também, ligação com a gestão e com o financiamento de pesquisa, a desvalorização, a sobrecarga de trabalho e o produtivismo acadêmico e com os discentes e os pares, em razão dacomparação, competitividade e do trabalho solitário.

Segundo Danielle, foi identificada pressão sobre o docente, considerando a obrigação de ter que orientar um aluno, ainda que o mesmo não esteja preparado; desta forma, considera-se que as relações socioprofissionais potencializam o sofrimento no trabalho. “Além disso, a necessidade de cumprir com as metas impostas tem influenciado negativamente no exercício da docência, por limitar o tempo destinado a indagação investigativa e as discussões para o avanço do conhecimento”, apontou a pesquisadora.

Entretanto, as relações de prazer acabam se sobressaindo muitas vezes. “Eu acho as disciplinas que eu participo excelentes, por exemplo, porque você pode ousar mais, você pode querer mais do aluno, você pode forçar mais aquele processo de aprofundamento, de reflexão. Então acho fascinante. Vivi isso em sala de aula várias vezes falando ‘nossa, eu quero morrer fazendo isso’”, conta um dos docentes participantes da pesquisa. 

Ainda de acordo com a enfermeira, a pesquisa revelou também, vivências de adoecimento na Pós-Graduação. Os participantes relataram expressões psíquicas, como síndrome do pânico, depressão, ansiedade, insônia e expressões físicas como, labirintite, hipertensão, bruxismo e queda de cabelo. 

"Os resultados obtidos com esta investigação podem contribuir para o planejamento de ações capazes de potencializar o prazer na Pós-Graduação. É essencial que as instituições implementem espaços destinados a escuta dos profissionais e propiciem discussões sobre a temática em questão. Ademais, fica a oportunidade de se repensar a lógica ensino/pesquisa na Pós-Graduação stricto sensu brasileira", concluiu Danielle.

Tese: Prazer e sofrimento de discentes e docentes de Pós-Graduação stricto sensu em Enfermagem
Autora: Danielle de Araújo Moreira
Orientadora: professora Maria José Menezes Brito
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem
Data da defesa: 7 de dezembro de 2018

Redação: Teresa Cristina– estagiária de Jornalismo
Edição: Rosânia Felipe